???O que você vai ser quando crescer, meu filho????
Crescer faz parte da vida. Escolher faz parte desse crescimento...
Esta parece ser a dúvida universal de todos os pais para com o futuro de suas crias. Com meu pai não foi diferente. Ele me fez aquela pergunta cabulosa quando eu ia lá pelos meus seis anos de idade. Apenas respondi: “Eu vou ser pedreiro, papai!”.
Meu pai era pedreiro e aquela era a única profissão que eu conhecia de perto. Ele me advertiu: “É bom você trabalhar com a caneta, como fazem os doutores!”. Ele disse caneta e eu pensei em palavras. Sim porque eu não entendia como saiam tantas palavras de dentro da caneta quando meu pai escrevia no papel. Achava aquilo mágico! Aí eu quebrava a caneta para achar palavras azuis que escorriam como tinta em minhas pequeninas mãos.
Hoje tudo mudou. Quebro a cabeça para escrever contos e crônicas. Sim, eu estou escritor. Estar é o verbo. E no princípio era o verbo porque ninguém é nada; quase sempre as pessoas estão.
E como se deu a descoberta das palavras? Fui desvendar o prazer da leitura e da escrita muito tarde. Mas nunca é tarde demais para descobrir a vida. Meu pai foi meu primeiro professor; foi ele quem me apresentou o alfabeto. No começo eram letras – eu pensava quem eram desenhos – no começo eram letras assustadoras: não memorizava os formatos e os sons. A palmatória do lado da cartilha de ABC também me condoía. Cada letra acertada, uma vitória e uma palmada a menos.
Aprendidas as primeiras letras, conheci só aos oito anos a tão falada escola. Meu irmão disse que era um lugar onde os fracos, os burros e os tímidos eram castigados. Nada além da verdade. Eu me sentia mortiço, bate-orelha e pudibundo.
Chorei.
Chorei mil choros e mil lágrimas até mamãe aparecer e em levar para casa. Com o tempo fui entendendo a pedagogia dos oprimidos daquele tempo infantil. Iniciei a primeira série sem saber ler e escrever coisa alguma. A professora era um terror de pessoa. Me fez escrever umas trinta vezes o nome da escola no caderno até eu acertas a escrita.
Daí parti para um universo de histórias em quadrinhos por influência de meu irmão. Como eu não sabia ler bem, olhava os quadrinhos e inventava a história ali mesmo, na hora. Na escola trocava as revistinhas com os colegas.
Dos gibis passei para os livros. Aventuras fantásticas, ficção científica, histórias de detetive e romances românticos. Nesse mesmo tempo comecei a rabiscar meus primeiros poemas: adolescentes, apaixonados e verdes. Ao primeiro livro lido e ao primeiro texto escrito, seguiram-se várias conquistas pelo mundo da leitura e das redações escolares, ambas propícias à minha eterna aprendizagem de leitor e de prosador.
A leitura era para mim uma viagem e a escrita a estrada a ser trilhada. Tímido, encontrava na escrita a forma de me expressar para o mundo. Na sétima série a professora fazia cada aluno ler um pedacinho de um texto do livro de português e, mesmo nervoso, gostava daquilo. As redações tonaram-se mais interessantes. Com o livro didático fui me familiarizando com os textos de poetas e escritores nacionais.
Passaram-se anos. Veio o vestibular, a grande peneira social da educação, e eu tinha que escolher um curso universitário. Dividido em fazer o que gosto ou ganhar dinheiro para viver, escolhi Letras e me lancei a um destino de professor. Ser ou estar? Por precaução me formei também em Jornalismo… Estar ou ser? E pensar que quando criança brincava com caixas de remédios, montando prédios e mamãe comentava: “Olha só, ele vai ser engenheiro!”; papai respondia: “Que nada, ele vai ser é médico!”
Escrever é um dilema. O escritor é um construtor de textos feitos com palavras. Eu estou aqui apenas como ajudante de pedreiro; pedreiro foi meu pai que me ensinou as primeiras letras e hoje lê meus textos com orgulho. Quanto a ser/estar escritor ou em qualquer ofício, uma escolha dessas não se faz pensando no desafio do trabalho ou na postagem de textos num país que pouco lê. A escolha nasce de lições que se aprendem dentro de casa, na família, quando seu pai lhe perguntou pela primeira vez: “Meu filho, o que você vai ser quando crescer?”
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